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A sigla A.C.A.B. e o número 1312 (posições dessas letras no alfabeto) significam “All Cops Are Bastards“, em tradução livre “Todos os Policiais São Bastardos”. As origens exatas do termo são desconhecidas, mas o consenso é que ele surgiu na Inglaterra na primeira metade do século XX. Independentemente de como surgiu, a expressão se refere à brutalidade policial praticada ao redor do mundo.
A polícia, em suma, é formada por pessoas da classe trabalhadora que são utilizadas pela elite como ferramenta de manutenção do poder. Desde sua criação, em 1808, as polícias militares (PM) no Brasil servem apenas para proteger o status quo, onde pobres continuam pobres e os ricos continuam enriquecendo, e para isso usam, sem medo, a violência.
Exemplo disso é o caso do massacre do Carandiru, onde em 2 outubro de 1992 a Polícia Militar do Estado de São Paulo assassinou 111 pessoas que estavam presas na Casa de Detenção de São Paulo, no bairro do Carandiru. Completando 30 anos do massacre, em 2022, ninguém pagou por essas mortes. Nem quem atirou, nem quem deu a ordem.
Essa impunidade alimenta a perversidade que começa no recrutamento. Em entrevista à Agência Pública, o ex-soldado da Polícia Militar do Rio de Janeiro Rodrigo Nogueira Batista, de 33 anos, relata:
“O processo de perversão começa no início da formação. […] O camarada que deveria ser treinado desde o início para policiar, já começa a ser apresentado a uma guerra. Dentro do CFAP (Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças), a cultura dos instrutores não é formar policiais. É formar combatentes.“
A polícia que mais mata e que mais morre
De acordo com o Anuário do Fórum de Segurança Pública Brasileiro, 6.145 pessoas morreram em decorrência de intervenções policiais no Brasil em 2022, com destaque para o Amapá, onde a taxa de pessoas mortas pela polícia chegou a 17,1 por grupo de 100 mil habitantes, quase 6 vezes a média nacional de 2,9 por 100 mil. O mesmo anuário revela que o número de suicídios de policiais militares e civis teve um aumento de 55,4%, em relação a 2021, com 121 vítimas.
Vários fatores contribuem para esses números. Rigidez hierárquica, salários baixos, equipamentos obsoletos e problemas familiares estão entre eles. O policial, para o Estado, é uma máquina para executar o serviço sujo de manutenção do racismo.
Através da necropolítica, conceito desenvolvido pelo filósofo negro, historiador, teórico político e professor universitário camaronense Achille Mbembe, o Estado define os lugares onde se tem licença para matar. Nas periferias das metrópoles, nos conflitos agrários do interior, nos morros, nas favelas.
Desmilitarização
O § 6º do artigo 144 da Constituição informa que as PMs são forças auxiliares e reservas do Exército, que pode, portanto, requisitar policiais, em caso de estado de emergência ou de sítio, para exercer atividades diversas da área de segurança pública.
Desmilitarizar a PM é desvinculá-la do exército e democratizar a instituição. Fornecer piso salarial para os policiais, programas de saúde mental, promover protocolos operacionais que valorizem o policiamento preventivo e não ostensivo.
Alguns argumentam que isso não é possível, outros defendem a proposta. Em entrevista à Agência Pública, a antropóloga Jacqueline Muniz afirma:
“A estrutura militar em si não limita o efeito do processo formativo para os policiais, o que impede o policial aplicar o que ele aprendeu é o abuso de poder. Há polícias de inspiração militar, como a Gendarmarie, da França, os Carabineri, da Itália, e a Guarda Civil Espanhola que foram democratizadas, têm grau elevado de formação e os direitos e deveres dos policiais são garantidos como cidadãos plenos. E essas polícias são muito bem avaliadas por suas sociedades e têm, inclusive, baixo índice de violência, corrupção e violação.”
Durante sua entrevista à Agência Pública, Rodrigo Nogueira também defendeu a desmilitarização:
“Quando você vê um soldado policiando, alguma coisa já tá errada. Ou o camarada é soldado, ou é policial. Ele pode até ser um soldado policial dentro do quartel, mas não na rua. O soldado tem uma premissa que é o quê? Matar o inimigo. O soldado é formado para eliminar o inimigo, e o policial não, pelo menos não deveria. O policial, ao contrário do que se acredita em boa parte da sociedade carioca, ele não foi feito pra matar ninguém. O policial não tem inimigo. O camarada que hoje tá dando tiro no policial, ontem pode ter estudado com ele, pode ter frequentado os mesmos lugares que ele. O criminoso é resultado da nossa sociedade, do nosso contexto. O crime é um fato social e o policial não pode enxergar o criminoso como um inimigo. Não é pra matá-lo. Prendeu, leva pra lei tomar as providências dela. Mas o que se convencionou acreditar é justamente o oposto.”
Conclusão
“No modo de produção capitalista, as relações de poder e as necessidades específicas das relações de produção no Brasil são estruturadas pelo racismo, que, enquanto ideologia justificadora de explorações, estruturou o capitalismo periférico brasileiro, o Estado, suas políticas e instituições, criando sujeitos racistas e dando condições para a manutenção e continuidade do sistema de exploração da mão de obra da classe trabalhadora e dos privilégios do grupo identificado socialmente como branco.” — Daniel Tadeu Alves, Periódicos da UFES
O Estado é capitalista e usa o racismo como estrutura de poder. A polícia é um instrumento do Estado para a manutenção desse poder. É preciso repensar a polícia, muitas questões precisam ser debatidas pela sociedade, mas uma coisa é certa: Todos os policiais são bastardos? Resumindo em uma palavra, sim.
Referências:
- A Brief History of ACAB – GQ
- Polícias militares têm origem no século 19 – Agência Senado
- Massacre do Carandiru – 30 anos de impunidade – Ponte Jornalismo
- “A perversão começa na formação”, diz ex-PM condenado – Agência Pública
- Treinados pra rinha de rua – Agência Pública
- Anuário do Fórum de Segurança Pública Brasileiro – 2022
- O que é necropolítica. E como se aplica à segurança pública no Brasil – Ponte Jornalismo
- A relação estrutural entre capitalismo e racismo: o genocídio da população negra enquanto projeto – Periódicos da UFES