Radiogaláxia – E01 | L. Amethista

Descrição:

No primeiro episódio do podcast recebemos L. Amethista, escritor e leitor sensível, que faz parte do coletivo Aroaceiros.

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Transcrição

[♪ Música de abertura]

Ash: Olá, eu sou o Ash, meus pronomes são ele e ela, e este é o Radiogaláxia, um podcast LGBTQ+ Spacey. 

[♪ Música se intensifica e depois abaixa]

(00:18)
Ash: Amante de literatura e arte, inimiga das normatividades. Esta é Lori Amethista. Bem vinda Lori.

Lori: Brigada (risos).

Ash: Primeiramente, quero te agradecer, em nome da equipe da Spacey, por aceitar o nosso convite, e pedir pra você se apresentar pro público. Quem é Lori Amethista?


(00:35)
Lori: Bom, primeiro, obrigada pelo convite e... Lori Amethista, na verdade meu nome não é Lori Amethista né. Amethista é meu pseudônimo, mas é engraçado porque acabou virando quase que um sobrenome. Meu sobrenome mesmo é com A, então ficou, vamos de Lori Amethista.


Mas Lori Amethista, eu, sou uma pessoa arromântica, assexual e agênero, aquela piada da pilha triplo A. Eu tenho 21 anos e uso todos os pronomes. Geralmente, tenho um pouco mais de preferência pelo masculino ultimamente, mas uso todos os pronomes. 


Como já falaram, sou amante da literatura, escrevo majoritariamente contos, mas tô num projeto de um livro um pouco maior. Todos com representatividade LGBTQIAP+, mas principalmente dando um enfoque maior para a letrinha A e pra letrinha T também, ultimamente. 


E além disso tudo, sou estudante de psicologia na crise do meio da faculdade, vivendo no meio desse caos, tentando escrever, fazer tudo junto ao mesmo tempo, mas a gente sobrevive. 


(01:50)
Ash: Você ainda faz parte do Aroaceiros?


Lori: Eu faço. Eu inicialmente tava lá só pra escrita e tradução e pesquisas, mas ultimamente eu tenho feito assim, meio que mais um trabalho assim de bastidores, de comunicação com a galera da AVEN, por causa do Dia Internacional da Assexualidade, tradução do censo arromântico da AUREA, essas paradas assim mais relações internacionais (risos).

Ash: (riso) Você ficou diplomata agora.

Lori: É, virei diplomata, eventualmente, às vezes consigo escrever alguma coisa também, mas geralmente é na base do desespero, como falei, não sobra muito tempo.


(02:34)
Ash: E a Spacey, como você conheceu?


Lori: Conheci pelo Twitter, eu não sei exatamente como, mas eu acho que por alguma das threads que vocês fazem, que são muito boas inclusive, eu acho que foi logo no início, não tenho certeza, por que eu sigo a Spacey a algum tempo. E aí eu ficava vendo as threads e ativei as notificações. Eu tenho as notificações de vocês ativadas (risos). Por que vocês fazem um conteúdo muito bom e não posta muita coisa, então é saudável ter a notificação ativada, pro meu celular sustentar. [Vocês] tem esse enfoque mais amplo pra comunidade LGBT toda, então é muito bom. E uma das poucas páginas que lembra também das outras letrinhas.


(03:20)
Ash: Entrando um pouco na parte do seu trabalho. Você lançou no dia 29 de outubro, no halloween, o conto chamado "Festa de Halloween". Conta para a gente sobre o que é esse trabalho.


Lori: Nossa, esse conto faz parte daquela coleção "Espectros de Roxo e Cinza", e na real eu tava com outra ideia pra essa coleção. Só que por contra de ocorrências eu acabei sendo remanejado pro lançamento de outubro, aí eu falei 'ok, a história que eu tinha em mente não ia ficar legal pro lançamento de outubro', por que era uma outra história, que eu ainda vou escrever um dia. Sobre uma idosa que se descobria assexual no dia seguinte da festa de aniversário dela de 80 anos.


Seria uma espécie de história em formato de diário, dela retomando ocasiões ao longo da vida dela, tipo casamento, término do casamento, filhos, etc. sob essa nova ótica de se entender como ace. 


Aí eu falei, 'pro halloween eu acho que não cabe muito, vou deixar pra outro momento'. Eu tava 'preciso de uma ideia nova' aí eu tive uma ideia maluca, do nada, e falei 'será que isso vai dar certo? Não sei, mas eu vou escrever.' Que do nada eu pensei assim: 'imagina que coisa louca' e foi bem assim, eu pensando sobre minha vida, 'imagina que coisa louca se eu descobrir que um amigo meu, sei lá, escreve fanfic sobre eu e ele, eu ia surtar muito.' E aí eu pensei 'cara isso dá uma boa ideia de história', e lá fui eu escrever essa história. 


E no final ela saiu totalmente diferente do que eu queria, mas saiu bem melhor do que eu tinha imaginado no início. 


Ash: Acho que escrita tem sempre dessas, a gente imagina uma coisa e termina com uma história diferente.


(05:11)
Lori: Pois é, acabei dando uma outra abordagem, sabe. Por que a abordagem ia ser mais nessa questão desse surto de ser um protagonista sexo-repulsivo, que é aquela pessoa que não se vê em situações sexuais, e o protagonista também não gostava de conteúdos sexuais no geral, mesmo na ficção. 


Era essa a ideia, ia ser sobre isso, só que no meio do caminho eu fiquei assim (pausa dramática) sabe, 'não tá dando pra mim' (risos).  Por que eu já fui uma pessoa muito sexo-repulsiva, mas hoje em dia eu sou muito indiferente com isso. E tava difícil pra mim escrever um personagem assim. 


E aí eu resolvi dar uma outra visão pra situação, resolvi justamente fazer um personagem que não tinha certeza de qual era a relação pessoal dele com isso, com coisas sexuais. E nesse meio de história, descobrir onde ele tá localizado no meio disso tudo. E aí entram mil questões que lendo a história vocês descobrem (risos).


(06:14)
Ash: Você falou que já foi muito sexo-repulsive e me veio a pergunta. Você escreve muito sobre representatividade ace, aro também, eu acho, mas você faz isso como uma forma de chegar em novas pessoas, espalhar noções sobre assexualidade e arromanticidade de uma forma saudável, ou é mais como se você tivesse contando sua vivência?


Lori: Essa é uma pergunta bem difícil. Eu diria que eu comecei naquela vibe que eu acho que quase todos os escritores aroace tem um pouco dessa vibe de: “eu não acho nada com a minha vivência, então tem que sentar a bunda que escrever porque eu não aguento mais.” E aí eu acho que foi muito nessa vibe que eu comecei, sabe, porque eu nunca tinha percebido que eu nunca tinha me lido numa história até eu ler um mangá com uma personagem assexual. Que é o mangá “Shimanami Tasogare”!


(07:07)
Lori: E aí eu lendo aquele mangá eu percebi. Eu falei assim, cara, eu nunca tinha lido uma história com um personagem assexual na minha vida. Isso é muito bizarro. E aí eu comecei a procurar livro e só achava livro gringo, ou aquele “Tash e Tolstói” que tinha publicado no Brasil. Eu li ele e não gostei muito. Então eu fiquei meio numa situação de revolta que eu falei… eu já gostava de escrever, só tinha parado de escrever porque eu tava te desesperançoso com o mercado editorial. 


E aí eu falei assim, “ah eu preciso voltar a escrever”, e a pandemia me deu a deixa perfeita de tempo livre para voltar a escrever. E aí eu resolvi que eu ia escrever para outras pessoas assexuais e arromânticas. Não era essa coisa de “eu quero conscientizar as pessoas que não sabe o que é isso através da minha escrita.” Não, era tipo mais assim “eu quero escrever para quem é aroace e não se vê nenhum lugar. Era esse o público que eu queria. Inclusive, eu comecei lançando histórias no Wattpad porque eu nem almejava ganhar dinheiro com isso.


Eu dizia que não era minha meta entrar no mercado editorial, porque tava muito desesperançoso ainda com tudo isso. Naquela vibe de, tipo, se eu não tiver numa editora grande não tem espaço pra mim. Ainda mais escrevendo coisas voltadas para um público aroace, que algo muito nichado. E era muito nessa vibe, e aí eu acabava escrevendo muito da minha vivência, ali naquele nicho.


Foi muito louco porque eu me descobri não-binário escrevendo uma história, durante a escrita da história. Porque foi em um momento que eu fui escrever sobre uma história que não era sobre uma pessoa aroace, era uma história sobre uma pessoa trans. E aí, eu acho que, só fato pensado em escrever essa história já disse muita coisa. Considerando que eu escrevia muito sobre minha vivência.


(08:54)
Eu tive uma crise enorme no meio escrita, por que era muito isso, eu escrevia muito desse lugar, da minha experiência. Mas agora, ultimamente, eu diria que desde o início desse ano eu já comecei a migrar mais para um outro lugar, sabe, porque eu percebi escrevendo assim, partindo da minha vivência sempre, eu acabava fazendo histórias muito parecidas. Todas elas, por exemplo, eram sempre sobre auto-descoberta ou sobre solidão em algum aspecto. E aí ficava muito repetitivo, né. Eu já tinha percebido isso, mas uma pessoa comentou para mim “é porque suas histórias são parecidas”. Eu fiquei assim… ai, doeu. E aí eu resolvi partir para esse desafio de escrever sobre coisas que eu não necessariamente tinha vivido. Mas é óbvio que vivência se mistura né, ali em algum aspecto. E eu acho que eu consegui romper isso da primeira vez, porque eu tentei escrever uma fanfic com protagonista allo e com conteúdo sexual. Não deu certo! Eu escrevi uma fanfic com conteúdo sexual com protagonista arromântico. Mas foi onde eu consegui chegar, né. Mas assim, foi ali, eu acho, o divisor de águas né, que eu cheguei assim e falei: dá pra escrever sim sobre coisas que eu não vivi, vamos lá!.


(10:03)
Ash: E falando no protagonista arromântico, você participou da coletânea FantasiAro também, né? 


Lori: Sim.


Ash: Qual que foi o seu conto lá?


Lori: O conto foi o “Águas de Esperança” e ele é totalmente diferente do “Festa de Halloween”. Os dois, tipo, muito diferentes, porque a “FantasiAro” é uma coletânea de histórias de fantasia necessariamente, então foi uma história de fantasia, sobre uma sereia e um pirata. E aí os dois são arromânticos e assexuais também, só que partindo de vivências diferentes, assim né. E é muito engraçado porque teve até uma coisa que eu percebi depois que eu escrevi a história, quando eu fui ler, que sem pensar muito acabei fazendo meio que um dualismo entre uma experiência mais ligada a masculinidade e uma experiência mais ligada a uma feminilidade. E aí eu achei muito louco porque teve uma pessoa que leu, e veio me perguntar, e falar que achou muito legal isso e eu falei “Meu Deus… alguém percebeu!”, sendo que eu não nem tinha percebido que eu tinha feito isso também né. 


Então, tipo, essa história tem isso né, ela tem dois pontos de vista né, e aí desde o início a minha intenção já era assim de mostrar tipo vivências diferentes de um mesmo… De uma mesma identidade né, porque essa é uma questão muito assim, que a gente bate muito nessa tecla nas comunidades aroace, de que tipo, nem toda pessoa arromântica ou assexual vai ter a mesma experiência né? É um espectro. E aí eu quis fazer isso, mas eu quis… Nem tipo… Nem… Eu não quis nem fazer tipo: “Ah, é uma pessoa demirromântica e uma pessoa, sei lá, arromântica estrita.” Eu quis fazer dois personagens arromânticos estritos, a princípio, com vivências diferentes para mostrar que mesmo dentro, tipo, dessas sub identidades existem diferenças diferentes, sabe? Que partem de lugares diferentes.


(12:05)


Ash: Nessas duas coletâneas que cê participou, como foi essa experiência de ter seu trabalho, seus contos, impulsionados por autories e alcançar um público maior, talvez, do que se fosse só lançar o conto sozinho?


Lori: Eu acho que foram experiências ótimas, de verdade. Eu acho que, por exemplo, eu nunca teria lançado nada na Amazon, mas talvez eu até tivesse deixado de escrever em algum ponto se não fossem essas coletâneas, né. por questões de tipo você tem um compromisso ali com aquelas pessoas. Então, tipo, inevitavelmente podem ter mil e uma questões que me impedem, me impediam ali de escrever. Inclusive, isso aconteceu principalmente com o FantasiAro porque o meu lançamento ele era ali pro meio do ano, só que eu tava no final do período da faculdade, então tava com muita coisa para fazer. E aí eu tirei tempo ali sei lá de que buraco para fazer, e aí foi até bom assim, porque acho que uma coisa ajudou a outra né… Tirar a cabeça um pouco da faculdade ajudou com a faculdade também da mesma forma que fez bem para mim, assim, enquanto ser humano, quando é preciso escrever alguma coisa mesmo com aquele momento conturbado né. E aí tem a questão também do apoio de todo mundo que tá ali junto né? 


A experiência do Fantasiaro foi bem diferente da do “Espectro em Roxo e Cinza” porque, é… A princípio também a galera do Fantasiaro né, a galera arromântica né tem menos visibilidade aí, e menos espaço em geral do que a galera ace né no mundinho da literatura. Então é até difícil assim você encontar às vezes escritores arromânticos dispostos a fazer um trabalho desses. E aí foi organizado pela Alanys Aleixo e ela literalmente… a ideia era ter mais pessoas do que teve, inclusive, mas ela inicialmente conseguiu contato com sete pessoa ques toparam participar. E aí no meio uma das pessoas acabou saindo porque não tinha condições de participar mesmo né, então acabaram ficando os seis né, mas assim foi muito bom assim organizar isso… muito bom essa coisa de um apoio mútuo, sabe? Todo mundo ali, de certa forma, eu acho que essa coisa do alcance né. Ela… ela é, mas não é. Tipo, acontece, mas não acontece. 


É muito louco porque você acaba alcançando o seu público médio mesmo, já que você já tinha, e mais algumas pessoas adicionais assim que acabam descobrindo a sua história através de outra história da coletânea né. E não é assim: “Ah o portal tá divulgando também, então os leitores do autor tal vão me ler!”, porque eu senti pelo menos em umas duas coleções que isso não acontece muito. E aí a gente vê isso assim, o resultado de venda, e etc.


Já “Espectro roxo e cinza” não foi algo bem maior assim, porque já tá aí há mais de um ano e aí no meio do caminho também teve uma questão que a gente teve problemas aí de organização mesmo, em relação a tempo para revisar as histórias, tempo para finalizar as capas… porque era um ritmo muito rápido né. Então a gente fez assim uma pausa e retornou o lançamento das histórias para poder organizar as coisas e lançar as histórias que ainda faltavam. Mas também teve muito essa coisa do apoio, e aí foi muito interessante também, porque eu que nunca tinha publicado nada na Amazon, mas nossa tipo… Aprendi muita coisa com a galera das duas coletâneas. Na FantasiAro, as pessoas de lá também nunca tinha publicado nada na Amazon, então a gente foi assim: atirando para todo lado no escuro. Mas a galera do “Espectro roxo e cinza” já tinha gente ali que né escreve há muito tempo, tem mó público consolidado, então foi bom assim no sentido de aprendizado também. 


Ash: Além das duas coletâneas, você tem outros três contos.


Lori: São três contos bem curtinhos, né. O primeiro deles é “Vívida, uma colorida epifania”. Esse conto… Tipo, esses três contos, na real, eu comecei a escrever naquela parada que eu já falei né, de tipo “quero mais histórias com personagem aroace”. Eu representei a minha vida de forma geral né, então vou soltar, escrever… E são todos baseados nas músicas do girl group de k-pop Loona porque era a minha obsessão assim na época. Eu acho que todas as músicas de Loona eu fiz algum headcanon LGBT em algum aspecto, então eu falei assim: “Tá eu vou escrever histórias baseadas nessas músicas”. As histórias não tem nada a ver com as músicas né, no final, enfim. E aí tem esse primeiro que é inspirado na  música “Vivid” da HeeJin, é o solo né, então são inspiradas nos solos do grupo. Esse é bem curto! 


A outra é  “Princesa gato”, eu gosto muito dessa história! Muito, muito, mesmo, e foi uma história também que aconteceu aquela coisa de mudar no meio do caminho porque eu ia escrever uma história sobre uma pessoa arromântica, e no meio do caminho eu percebi que essa história, tipo… Representava muito também, de certa maneira, uma vivência lésbica. E aí, no fundo… do segundo final eu só escolhi não falar nada, sabe? Porque seria uma pessoa tipo  arromântica estrita, mesmo que não… sem nenhuma orientação guiada, gênero-guiada, então resolvi deixar mais em aberto assim tipo porque daí era justamente a identificação, e não necessariamente ficar dando nome à coisa ali com essa história. 


Tem essa e aí tem “Meu Eu” que era inspirada na música “Let me in” da HaSeul, e essa foi a história que eu falei né, que fez eu descobrir que eu sou uma pessoa não binária no meio do caminho (riso). E eu tenho um carinho imenso por essa história, e aí é muito louco e depois dela eu parei assim com esse projeto por questão de tempo, mas eu acho que também por um pouco de medo. Porque essa história mexeu muito comigo, e aí deu um pouquinho de medo… Eu lembro assim de detalhes do processo dela né, porque me marcou realmente demais né. E aí eu lembro que eu ia lançar ela em outubro de 2020, e aí eu comecei a escrever… Não, eu ia lançar ela em novembro, comecei a escrever em outubro, e aí eventualmente no meio do caminho eu empaquei! E eu falei assim: “eu não consigo mais escrever essa história”. 

E eu não entendi porque que eu empaquei daquela forma, eu fiquei assim: “Ah, bloqueio criativo padrão, né?” Mas eu queria muito terminar essa história, porque eu tinha um headcanon muito forte que essa música “Let me in” da HaSeul, do Loona, era sobre uma pessoa trans… Eu tinha esse headcanon muito forte, para mim era algo muito certeiro. Eu falei: “Eu preciso escrever essa história!” Eu acho que eu comecei todo o projeto só para chegar nessa história, e aí eu lá nesse meio de caminho empaquei ali, e eu não tava assim entendendo porque né…E aí eu tipo falei, “Ah, não vou ficar batendo cabeça aqui para escrever, eu vou fazer outras coisas e aí uma hora eu volto.” E aí outras coisas que eu fui fazer foram pesquisar sobre vivência trans, e principalmente vivências não binárias e tal, porque era algo que eu já conhecia, eu já sabia. Eu tinha pessoas não binárias em círculos de amizade, mas eu não tinha o conhecimento, assim, sobre isso necessário. 


E aí eu falei assim: “Eu acho que eu empaquei porque eu não tenho conhecimento necessário para escrever essa história, eu preciso aprender mais.” E aí foi o negócio né, que eu fui lendo e me identificando, identificando e falando “Ai meu Deus!”, sabe? Coisas assim que eu pensava, que eu falava “eu não sabia que isso era por conta disso”, sabe? Porque ainda tinha uma questão que, por exemplo, muitos… É meio zuado essa ideia né, de a vivência trans é desconforto com o próprio corpo, mas isso entra para mim né, na minha vivência se encaixa. Porque eu tinha certos desconfortos com o meu corpo que eu não associava que pudessem ser relacionados à vivência trans, eu achava que era relacionada a minha vivência ace. E aí tinha coisas assim que tipo… e eram coisas que às vezes eu falava em grupos aces que as pessoas não entendiam muito bem, e eu ficava assim: “Ah tá, a pessoa só não tem essa vivência específica aqui né?” 

E aí eu fui percebendo que, na verdade, eram coisas muito mais ligadas a uma questão de gênero do que a uma questão de sexualidade em si. E aí foi muito assim… bizarro. E aí eu lembro que eu falei assim: “Tá, eu preciso voltar para história”,  mas eu fiquei sem coragem! Porque eu falei assim: agora mudou um pouco a abordagem dessa história, antes era algo totalmente alheio a mim, agora é algo que é muito próximo de mim de alguma forma. Mas eu não queria abandonar a história e aí eu falei assim “em Janeiro tipo… em janeiro não, até o final do ano eu vou terminar essa história!” 


E acho que no dia 31 de dezembro eu ainda não tinha voltado na história, e eu fiquei assim… “Cara, eu preciso terminar essa história, eu não posso terminar o ano sem voltar para a história.” Aí eu sentei assim, eu ia passar o Réveillon em casa mesmo, então foi meio assim “Dane-se!”, e aí eu só sentei e eu falei assim, que eu vou escrever pelo menos um pouco para dizer que eu voltei para a história antes do ano acabar. Aí eu escrevi um pouco, e aí a minha mãe veio me chamar que num sei o quê, que tinha que ver coisa do ano novo, pipipi popopo, foi lá e eu fiquei assim o tempo todo pensando “eu preciso voltar lá pra história”, porque eu tinha conseguido voltar a escrever. 

Aí passada coisa de comemoração de ano-novo, a primeira coisa que eu fiz no ano foi voltar e sentar no meu computador e escrever a história, e aí eu fiquei escrevendo a história até nascer o sol. Eu só literalmente parei de escrever quando eu terminei a história né, aí foi muito louco porque eu chorei muito também quando eu terminei essa história. Então por isso que eu falo que é provavelmente a história que eu tenho mais carinho, assim, porque ela simboliza muita coisa para mim… de tanto que depois disso eu só voltei para ler ela às vezes que eu revisei antes publicar. Depois eu não voltei porque eu falei: “Eu não tenho coragem!” Ainda mais se eu voltar e descobrir que sei lá… a história é ruim, aí eu vou ficar muito triste.


(21:57)
Ash: Foi uma história de descoberta do protagonista e do autor também.

Lori: Sim, foi literalmente isso, porque a história era da protagonista se descobrindo trans e aí lá foi eu junto. E o pior é que tipo, de certa forma, foi uma coisa muito besta porque eu usei um… sei lá um negócio que eu até acho que é até meio estereótipo. Tipo aquela coisa de tipo “Ai porque tem algo…”, eu sou uma pessoa designada do sexo feminino ao nascer, então tinha uma coisa assim de tipo “tem algo de masculino dentro de mim” nessa história que fica assim…Pairando ali, e aí eu acho até isso meio besta hoje em dia. Eu falo assim: “meu Deus não é essa a parada, sabe?” Mas assim na hora ali era, era o que eu tava sentindo, então eu não mudaria


(22:45)
Ash: Dentre essas escritas, você diria que encontrar um gênero assim de conto romance fantasia como foi na FantasiAro que você sente confortável para escrever dizer que … é, que você gosta realmente de escrever?


Lori: Eu acho que não, sinceramente. Eu acho que eu posso dizer que o que me deixa confortável e eu me encontrei muito é nos contos em si, esse formato né mesmo. Não de gênero, com certeza, porque eu tinha muito essa crença, principalmente quando era adolescente de que tipo: “Ah, para escrever tinha que ser romancista, escrever trilogias imensas”. E aí  hoje em dia eu falo assim: “Ai gente não,  não precisa disso às vezes sei lá, 5.000 palavras é mais do que suficiente para você contar uma história que não tem porque se prolongar né?” Então eu gosto muito da… dos contos né, em especial porque eu acho muito incrível também, como tipo, em poucas páginas você consegue contar uma história completa. 


Mas assim… de gênero não sei sabe? Eu posso dizer assim que o que flui melhor para mim, o que fluiu né melhor para mim quando eu escrevia até hoje foram… foram justamente a história da FantasiAro, de fantasia. Eu acho que é porque eu podia inventar o que eu quisesse, porque era uma história de fantasia. E, surpreendentemente, as cenas eróticas do “Festa de Halloween” fluíram muito rápido. (Risadas). Eu escrevi aquilo muito rápido.


(24:12)


Ash: São situações que.. Que.. dá liberdade criativa.


Lori: É… eu acho que, é isso, são momento que dá mais liberdade. Porque, por exemplo, histórias mais assim, contemporâneas principalmente, sem aspectos de fantasia né… Tem muita coisa que você acaba tendo que ser fiel à realidade ali, se não o leitor, sabe…Algum leitor, em algum momento, vai encher o saco. Vai olhar e vai falar: “Não isso aqui não tá fiel, eu não gostei”, e vai largar o livro. Então, assim, eu já fui esse leitor né, quando era mais novo né. Eu acho que eu gosto um pouco da ideia de me desprender mais da realidade né, por exemplo, fantasia urbana seria porque eu gosto também de tratar de questões do contemporâneo, mas eu não gosto de me prender as obrigações contemporâneas. Então às vezes eu penso, por exemplo, eu me encontraria muito bem em uma fantasia urbana.


(24:58)


Ash: Por falar nisso, você tá escrevendo alguma coisa nesse momento? Tem algum projeto em andamento?


Lori: Nesse momento literalmente eu não tô escrevendo nada assim de ficção. Tem sido difícil até ver livro né, mas tem ideia… Estou aqui elaborando ideias na minha cabeça, porque eu faço isso também. Eu passo muito tempo elaborando as ideias na minha cabeça, criando mil aspectos de personagem, mil coisinhas, até que um dia eu chego lá eu sento e em uma semana… Sei lá, feriadão prolongado, eu sento e escrevo tudo. E depois fico ajeitando né, polindo ali aquela história. E essa parte também né, eu vou dizer que eu acho muito chata também né, porque chega um momento em que você já tá cansado da sua própria história.


(25:43)


Ash: Às vezes me arrisco a escrever alguma coisa e, acho que você acaba tentando polir tanto a sua escrita que chega um momento que é decisivo, se você continuar polindo vai acabar tirando a ideia original ou a mensagem que você queria passar.


Lori: Sim, eu tenho muito essa questão com revisão principalmente. “Festa de Halloween”, por exemplo, eu fiquei muito feliz que eu contratei uma revisora que foi ótima nesse aspecto, sabe? Qualquer coisinha assim… que ela disse assim… que ela ficava assim na dúvida tipo, “isso aqui é uma questão que tá assim de propósito ou não”, ela vinha e perguntava né? Porque às vezes tem isso, às vezes é questão da sua escrita e não uma questão de um erro.


[♪ Música de transição]


(26:28)


Ash: Acho que é isso Lori, queria te agradecer novamente por aceitar nosso convite participar desse projeto novo da Spacey e pedir para você divulgar seu trabalho e suas redes. Fica a vontade aí para se despedir.


Lori: Obrigada também por me convidar, e obrigada também a todo mundo que tá ouvindo né, podcast. Ouçam os outros episódios também que eu vou estar esperando os outros episódios para ouvir também! Todas as minhas histórias vocês podem encontrar ou no Wattpad ou na Amazon né, no caso da FantasiAro e a do “Espectro roxo e cinza”, todas sob o pseudônimo de L. Amethista com “tha” no final. Mas vocês podem me encontrar no twitter @sailorassexual, uma referência à Sailor Moon (Risos). E é isso!


Ash: É isso pessoal, Obrigado por todo mundo que ouviu até aqui, brigad viktor por estar aui nos bastidores. beijo e até a próxima.


[♪ Música de encerramento]