O que é transfobia estrutural

Transfobia significa qualquer ato de ódio, violência, aversão e/ou discriminação contra pessoas transgênero, ou seja, aquelas que não se identificam com o gênero que lhes foi designado ao nascer. Por causa de uma construção social cisnormativa, que vê como “padrão” as pessoas cisgênero — que se identificam com o gênero que lhes foi designado a nascer —, a transfobia é manifestada de diversas formas na sociedade.

Porém, a violência contra pessoas trans se estende para além da transfobia interpessoal e direta — que se manifesta em ações preconceituosas com ataques diretos e propositais, normalmente individuais —, fazendo-se presente também na estrutura da sociedade, o que dificulta o acesso de pessoas trans a emprego, saúde, educação e outros direitos fundamentais humanos. Isso é definido como transfobia estrutural. A falta de políticas públicas inclusivas e a ausência de representatividade em espaços de poder marginalizam as pessoas trans, colocando-as em constante posição de risco e impedindo que essas pessoas sejam vistas, acolhidas, compreendidas e protegidas. 

A transfobia estrutural é uma das causas dos altos índices de ansiedade, depressão e suicídio entre a população trans, que tem a expectativa de vida de apenas 35 anos. Pessoas trans enfrentam barreiras significativas no acesso a serviços de saúde adequados, incluindo falta de profissionais capacitados e ambientes hostis, o que também contribui para essa estatística.

Até mesmo os dados em relação às pessoas trans não estão incluídos em pesquisas oficiais, como as do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dificultando o acesso a informações que podem levar a mais iniciativas para promover os direitos das pessoas trans e escancarando a omissão do Estado em tomar ações a favor desse grupo marginalizado. Dito isso, a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) fez sua própria pesquisa, criando, em 2017, o Mapa Dos Assassinatos De Travestis e Transexuais No Brasil, fazendo um levantamento de dados importantes para a população e evidenciando a transfobia enraizada na sociedade, uma vez que o Brasil é um dos países com os maiores índices de violência contra pessoas trans.

A Antra também afirma que cerca de 90% das travestis e mulheres trans no Brasil têm na prostituição sua principal ou única fonte de renda e diz ainda que mais de 70% das pessoas trans abandonam os estudos ainda na infância ou adolescência. Isso acontece porque pessoas trans — especialmente mulheres trans e travestis negras — enfrentam enormes barreiras para conseguir e se manter em empregos, por causa da transfobia estrutural, que reforça e  incentiva o bullying, a discriminação e as violências nas instituições de ensino e no mercado de trabalho.

Mas, então, como combater a transfobia estrutural? 

Combater a transfobia é um passo necessário para a redução da pobreza e a promoção da justiça social, em consonância com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 1 da Agenda 2030 da ONU: “Erradicar a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares”. Por isso, é preciso promover a empregabilidade de pessoas trans, incentivar a implementação de leis que protejam os direitos das pessoas trans e promovam sua inclusão social, além de investir na educação e representatividade para mudar as raízes transfóbicas da sociedade desde a sala de aula. 

Outros passos essenciais são a promoção da capacitação de profissionais de saúde para atender às necessidades da população trans e o apoio às organizações trans, que criam espaços seguros para essa população. 

Além disso, é importante apoiar movimentos importantes para a causa, como o Transfeminismo, descrito por Jaqueline Gomes de Jesus (2014), professora, pesquisadora e ativista transfeminista brasileira, como “uma linha de pensamento e prática que rediscute a subordinação morfológica do gênero (como construção social) ao sexo (como biologia), condicionada por processos históricos, criticando-a como uma prática social que tem servido como justificativa para a opressão sobre quaisquer pessoas cujos corpos não estão conformes à norma binária homem/pênis e mulher/vagina […]”.  Surgido nos anos 1980, o transfeminismo busca dar visibilidade às vivências trans por meio de produção de conhecimento, articulação política e luta por direitos. Como destaca Jinx Vilhas, doutorande em Antropologia Social na Unicamp, o movimento nasce da urgência de pessoas trans se organizarem politicamente e refletirem sobre suas experiências de corporalidade, cuidado, subversão, violência e exclusão.

Romper com a estrutura transfóbica da sociedade é urgente e requer ações concretas, representatividade trans em espaços de poder e políticas públicas inclusivas. A luta contra a transfobia estrutural é uma questão coletiva de promoção dos direitos humanos e visa, a longo prazo, mudanças profundas nas instituições e na sociedade, em busca de uma qualidade de vida para todas as pessoas transgênero.


Referências


Ficha técnica

Escrita: Bettina Winkler
Leitura crítica: Viktor Bernardo Pinheiro
Revisão: Déborah Ramos e Brian Abelha