Anjo Azul é um termo utilizado para referenciar as pessoas dentro do espectro autista, sendo comumente falado por pais e cuidadores como forma de elogio e carinho. Não se sabe ao certo como, quando e quem deu origem a essa expressão, até porque Anjo Azul é visto dando nome a várias situações (como para nomear grupos musicais) e em meios diversos, não apenas como um termo relacionado ao autismo, mas acredita-se que sua popularização nesse contexto específico ocorreu em meados de 2010.
Embora pessoas neurotípicas usem a expressão como algo positivo, muitas vezes sem nenhuma malícia ou conhecimento sobre suas problemáticas, é preciso alertar sobre o quão inadequada ela é.
A palavra anjo, quando relacionada ao contexto do autismo, pode ser interpretada como fazendo referência a diversos estereótipos, o principal deles sendo o da pureza, pois ainda há uma crença muito forte de que, devido a características que alguns autistas apresentam (como a dificuldade em interpretar sinais sociais e em mentir), essas pessoas são inerentemente puras e boas.
Também pode-se associar a figura angelical com a falta de líbido e a inexistência de uma sexualidade, características estereotipadas e prejudicialmente relacionadas ao autismo, auxiliando no apagamento, repreensão e silenciação da autonomia sexual desse grupo, assim os colocando no imaginário popular como pessoas clinicamente incapazes de consentir e expressar uma sexualidade saudável.
O azul da expressão também remete a um achismo que se tornou senso comum: o de que a maioria dos autistas são meninos. Isso não é 100% mentira, já que realmente existia uma prevalência maior do transtorno em garotos cis, mas a cada dia mais outras pessoas estão recebendo seus diagnósticos, quebrando a crença de que o autismo se trata de um transtorno exclusivamente masculino. Portanto, ao carregar em seu nome uma cor que é associada exclusivamente a pessoas masculinas, a expressão invisibiliza ainda mais a parcela feminina e não-binárie dês presentes no espectro.
Associações do autismo com ingenuidade e completa incapacidade socioafetiva ainda são muito comuns no meio des responsáveis por essas pessoas (pais, cuidadores e educadores), já que nossa sociedade carece de políticas e projetos eficazes para a formação de cuidadores devidamente informados sobre o assunto, o que acarreta em várias crenças, expressões e métodos questionáveis sendo compartilhados como adequados. Isso tudo está tão enraizado em nossa sociedade que, muitas vezes, outres de fora do meio (e dentro dele) não percebem os problemas de suas falas e ações. É preciso bastante diálogo para fazer entender que, mesmo sem más intenções, o uso de termos como Anjo Azul são ofensivos e que pessoas dentro do espectro autista querem ser vistas e reconhecidas pelo que são, sem a necessidade de embelezamento ao se referir a sua condição.
Referências
- “Eu não sou um Anjo Azul”: a sexualidade na perspectiva de adolescentes autistas – SciELO
- Anjo Azul – Introvertendo
Ficha técnica
Escrita: Chenny
Revisão: Ingredy Boldrine, Brian Abelha