O racismo religioso no Brasil é uma forma de preconceito e violência direcionada principalmente às religiões de matriz africana, como o candomblé e a umbanda. Diferentemente da intolerância religiosa genérica, o racismo religioso está profundamente conectado ao racismo estrutural que marginaliza as tradições culturais e espirituais ligadas à população negra.
A criminalização dessas religiões remonta ao período colonial, quando o catolicismo era a única prática religiosa permitida, e rituais afro-religiosos eram tratados como ameaças à ordem social, frequentemente associados a figuras do mal.
Essa violência persiste nos dias atuais. Em 2022 o terreiro de mãe Elza de Iemanjá, em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, foi completamente depredado por moradores influenciados por discursos neopentecostais que associavam a prática ao demônio. Em 2023, um grupo armado invadiu um terreiro em Salvador, na Bahia, ameaçando os praticantes e destruindo os assentamentos sagrados. Esses ataques ilustram a dimensão física e simbólica da violência enfrentada pelos adeptos dessas religiões.
Racismo Religioso x Intolerância Religiosa
Enquanto a intolerância religiosa se refere à rejeição de crenças diferentes, o racismo religioso está enraizado na discriminação racial e cultural. O professor Sidnei Nogueira, escritor e pesquisador brasileiro reconhecido por seu trabalho no campo das relações raciais, argumenta que tratar esse fenômeno apenas como intolerância invisibiliza a violência estrutural enfrentada pelas religiões afro-brasileiras, marcadas pela exclusão e perseguição histórica.
As raízes dessa opressão estão na hierarquização racial criada durante a escravidão e sustentada pelo colonialismo europeu. Kabengele Munanga, antropólogo e professor, destaca que essa lógica de desumanização foi legitimada por interpretações teológicas e pseudocientíficas, como o mito bíblico de Cam, que associava os negros à servidão.
Mesmo após avanços legislativos — como as Leis 14.519 e 14.532 de 2023, que ampliaram a tipificação do racismo religioso e reconheceram a importância das tradições afro-brasileiras —, a subnotificação de casos e a falta de representatividade das comunidades tradicionais nos espaços de poder limitam os impactos dessas medidas.
Impactos e Enfrentamento
A perseguição às religiões de matriz africana afeta não apenas o âmbito espiritual, mas também os valores socioculturais e identitários das populações afrodescendentes. De acordo com o filósofo Silvio Almeida, o racismo religioso é uma ferramenta de necropolítica, que regula vidas e mortes, reforçando o genocídio da população negra. Essa violência se manifesta até mesmo contra cristãos negros, que enfrentam discriminação racial associada à aparência e ao contexto periférico.
Para enfrentar o racismo religioso, é fundamental implementar políticas públicas que promovam a denúncia, a educação crítica e a valorização da diversidade cultural. Combater esse preconceito prevalente na sociedade brasileira é um ato político essencial. A resistência dos adeptos das religiões afro-brasileiras não é apenas uma afirmação cultural, é também uma luta por reconhecimento e dignidade em uma sociedade que historicamente tenta silenciá-los.
Referências
- Religiões de matriz africana são os principais alvos de intolerância e racismo no Brasil | Jornal USP
- Racismo Religioso | Religião e Poder
- Entenda o que é racismo religioso | G1
Ficha técnica
Escrita: Reinaldo Coutinho Simões
Revisão: Ingredy Boldrine e Brian Abelha