LGBTs Querem Destruir a Família?

O conceito de família é relativo ao meio sociocultural e ao período histórico, portanto não é o mesmo para todas as sociedades e tende a mudar ao longo do tempo. Além disso, o modo de produção possui grande influência nesse quesito, tendo influenciado, a partir dos moldes de sociedade patriarcal, a origem da monogamia.

Friedrich Engels, filósofo alemão, aponta que a família monogâmica, baseada no casamento entre um homem cis e uma mulher cis e na reprodução biológica, é uma criação histórica da sociedade patriarcal. De acordo com o autor, as diferentes formas de família surgiram da evolução da sociedade, em que a transição dos casamentos em grupo para a monogamia foi um marco importante no progresso da sociedade. Ele argumenta que a família patriarcal surgiu como resultado da necessidade de controlar a reprodução e a herança de propriedades, originada em sociedades de modo de produção escravista e primariamente agrícola, em que a terra era vista como um recurso fundamental. 

Engels, em suas análises, observa que a família patriarcal não é a única forma de organização familiar encontrada na história. Ele destaca sociedades matrilineares e matrifocais em que a linhagem e a herança são transmitidas por meio da linha materna, e em que as mulheres desempenham papéis importantes na tomada de decisões familiares e na organização da vida comunitária.

Quanto às relações de gênero de pessoas LGBTQIA+ e aos aspectos cisnormativos que estruturam a ideia de família na sociedade contemporânea, Engels não aborda diretamente essas questões, já que seu livro foi escrito em uma época em que essas questões ainda não eram amplamente discutidas. No entanto, sua análise histórica sugere que as formas de organização familiar são historicamente contingentes e que as normas e expectativas em relação à família podem mudar com o tempo e as transformações sociais. Por isso, o conceito de família deve ser entendido como inconstante e relativo não só ao tempo histórico em que está inserido, mas também ao modo de produção de uma determinada sociedade. Além de que demandas sociais podem vir a manifestar a necessidade de uma mudança.

O conceito de família que é dominante na sociedade ocidental contemporânea é baseado em padrões heteronormativos e cisnormativos, que privilegiam a ideia de que a família é composta por um casal heterossexual e cisgênero, com filhos biológicos. Essa visão exclui outras formas de relações familiares, como aquelas formadas por pessoas LGBTQIA+, que são marginalizadas e invisibilizadas pela sociedade. Tal exclusão vai além de diferentes identidades de gênero e de orientações que envolvem atração por gêneros de mesmo alinhamento, de forma que pessoas intersexo, arromânticas e assexuais também podem ser postas de lado desse modelo de família, uma vez que suas identidades e experiências não são abarcadas nem reconhecidas dentro desse padrão normativo.

A exclusão de formas diversas de família pela sociedade ocidental contemporânea, baseada em padrões cis e heteronormativos, tem levado à emergência de um discurso que defende que a família é baseada em vínculos afetivos, e não em relações puramente biológicas. Esse discurso reconhece a importância de laços afetivos e emocionais na construção de famílias diversas, que podem ser formadas por pessoas de diferentes identidades de gênero, orientações sexuais e formas de afeto. Essa visão ampliada de família busca valorizar relações baseadas no amor, na solidariedade e no cuidado mútuo, em vez de se limitar a padrões normativos que excluem pessoas e experiências de gênero diversas.

A comunidade LGBTQIA+ não quer destruir a ideia de família, mas mostrar que existem outros tipos de organizações familiares que diferem do conceito ocidental CHAP (cis, hetero, allo e peri, ou não-LGBTQIA+). Portanto, pessoas queer não têm o propósito de “destruir a família”, mas simplesmente buscam ter o direito de formar suas próprias famílias de acordo com suas orientações sexuais e identidades de gênero. O conceito de família tem mudado ao longo do tempo e em diferentes culturas, e as pessoas LGBTQIA+ lutam pelo direito de incluir suas famílias e relações afetivas nas definições e reconhecimentos legais de família. 


Referências: