No meio midiático, representatividade é essencial para sabermos que somos vistos, entendidos e que nossas vivências são importantes. Todavia, ainda mais essencial é que todos sejam retratados nesse meio de um modo digno e saudável, longe dos entraves de uma representação mal-feita, estereotipada ou fetichizada. Quando falamos em aquileanos, muitas vezes nos deparamos com essa última questão: a fetichização.
Ao contrário do que muitos pensam, apesar de ser frequentemente retratado, muito do conteúdo aquileano é reproduzido de forma a retratar sua realidade de forma deturpada. Não é novidade vermos um personagem aquileano cujo único traço de personalidade é ser aquileano, ou então um personagem mergulhado em caricaturas do que os outros acreditam que se encaixa nas experiências de ser homem/alinhado ao masulino e gostar de outros homens/alinhados ao masculino.
Ademais, ao darmos de cara com representatividades aquileanas, devemos sempre nos fazer a pergunta: quantas representações, de fato, foram escritas por aquileanos? Quantos personagens vemos realmente tendo uma história, uma narrativa que vá além de simplesmente se atrair por garotos?
Ainda é muito recorrente, principalmente no meio das fanfics (histórias escritas por fãs) a inclusão de personagens aquileanos por mero fetiche. Sem dúvidas, as fanfics são um grande aval de representatividade: em um mundo onde a heterocisnorma ainda é a regra, muitas mídias deixam a desejar quando a questão é a representação de minorias. Quando acontece de uma minoria ser retratada, muitas vezes é um trabalho feito de forma irresponsável ou simplesmente incompleto, abrindo espaço para o pleno exercício da criatividade e da imaginação na internet através das fanfics.
Entretanto, o que vemos muitas vezes é um verdadeiro show de horrores. A representatividade aquileana, que deveria ser feita de modo a incluir esse grupo nos mais diversos veículos de entretenimento, frequentemente é feita de forma irresponsável, sendo utilizado do título “representatividade” para retratar aquileanos de forma sexualizada, com vivências que nada se assemelham às suas realidades.
Nesses casos, o que mais é observado são mulheres cisgênero escrevendo sobre protagonismo aquileano sem realmente buscarem entender sobre suas vidas e experiências. Além disso, é preocupante como na representação de aquileanos sempre existe um padrão: homens cisgênero, monosexuais, brancos, magros e sem deficiência se relacionando com outros homens exatamente iguais. A exclusão de pautas referente a gênero, raça e sexualidade é alarmante, e apenas evidencia como essa chamada “representatividade” tem um objetivo muito específico: sexualizar homens em uma perspectiva falocêntrica.
A problemática por trás dessa questão consiste, também, nas mesmas pessoas que consomem conteúdo aquileano afirmarem que não consumiriam conteúdo sáfico ou até mesmo duárico. A pergunta é: por quê? A objetificação de aquileanos, desse modo, é feita com o único objetivo de satisfazer um prazer sexual daqueles que consomem esse conteúdo.
Esse comportamento abre espaço para, por exemplo, a transfobia, sendo criados universos onde homens cis possuem a possibilidade de engravidar e ignorando a existência de pessoas trans, para além de racismo, gordofobia, capacitismo e misoginia.
Além de não ser admitido qualquer homem que fuja a um padrão específico, ainda é muito presente a inserção de personagens femininas para causar intriga na história. Dentro desse debate, quando um dos personagens aquileanos é multisexual, todas as parceiras dele são alvo dos mais diversos tipos de ataques. Como resultado, uma horda de leitores disseminam discurso de ódio embebido na misoginia, culpando a personagem feminina por “estragar o casal”.
Por fim, é importante comentar acerca de fujins, fujoshis e fundashis. Originalmente, o termo “fujoshi” surgiu no oriente e significava “garota podre”, para designar garotas que eram fãs de conteúdo envolvendo Boy’s Love (amor entre garotos). Com o tempo, termos como fujin e fundashis também foram criados, para representar pessoas no geral, incluindo homens, que consumiam esse mesmo conteúdo. Apesar de ser um termo ofensivo, embasado no machismo e na homofobia, o termo logo foi ressignificado, passando a ser usado por esses grupos como um nome “oficial”.
No entanto, na prática o termo é usado por pessoas fetichistas, principalmente mulheres cis, as quais possuem uma péssima reputação por shipparem e sexualizarem os mais diversos tipos de conteúdos que apresentem dois homens (aquileanos ou não). A vivência de aquileanos não é objeto de prazer para um determinado grupo, assim como não deve ser a vivência de sáficas e de nenhuma outra parte da comunidade LGBTQ+.
A luta por uma representatividade que não seja nociva não deveria ser uma constante, e sim algo desnecessário. Todavia, na realidade em que vivemos, sabemos que ela não é nos dada assim tão fácil – precisamos sempre bater na mesma tecla de que sim, nós vivemos e importamos; e sim, queremos ser representados de modo digno. Longe de caricaturas, estereótipos e, acima de tudo, fetichizações.