Nomes étnicos

As etnias podem ser entendidas como grupos definidos historicamente através de suas interações, possuindo sua própria linguagem, forma de organização e costumes. As etnias não podem apenas ser compreendidas pela origem geográfica de um povo, já que um mesmo povo com diferentes trajetórias pode adotar costumes diferentes. As etnias podem se formar por diversos fenômenos como migração voluntária ou forçada. Elas se auto definem e são definidas por grupos externos. Já os nomes são peças chave na construção de identidades, na inserção de indivíduos em sua família e sociedade, e na identificação e continuação de sua origem e história. O nome diz respeito a individualidade de um sujeito e pode servir como uma forma de externalizar suas origens e tradições.

No Brasil, o direito ao nome é compreendido pela legislação como fundamental. Mas na prática, os nomes étnicos podem ser julgados como passíveis de “exposição ao ridículo”, já que tal característica é determinada pela subjetividade do oficial do registro civil. Tal norma dificultou não somente a retificação de prenomes étnicos mas também a adição do nome da própria etnia juntamente ao registro civil em pessoas indígenas. Para complexificar ainda mais a situação, o Estado brasileiro ainda possui leis e práticas contrárias aos direitos à expressão cultural e proteção das vidas e terras indígenas e de outras minorias étnicas. 

Indígenas relatam que em seu registro seus pais foram barrados de dar-lhes um nome étnico, com a alegação de que isso iria prevenir o preconceito. No entanto, esses indivíduos ficam divididos: possuem um “nome de branco” no registro, e utilizam seu nome indígena em suas comunidades. O nome no registro não é o nome pelo qual são chamados e não é o nome pelo qual possuem ligação afetiva. Os nomes de suas etnias, como “Pataxó” e “Kambeba” são importantes adições como identificadores grupais e de suas origens, porém, também são frequentemente barrados no cartório, cenário que apaga a cultura e a linguagem indígena.

No caso de imigrantes europeus, parece ter havido uma tentativa por parte de alguns de “aportuguesar” seus nomes. No caso de italianos que migraram para Campo Largo, muitos tinham seus sobrenomes traduzidos pela igreja em seu casamento, ou no casamento de seus filhos. Já em Curitiba, pastores alemães mantinham a grafia alemã dos nomes dos imigrantes (ou seus descendentes) em seu batismo, mas por vezes os modificaram no casamento. Isso se deu provavelmente com a intenção de inserir melhor essas comunidades recém chegadas à sociedade brasileira.

Já no caso dos povos negros trazidos da África forçosamente para serem escravizados na Bahia, os nomes eram atribuídos compulsoriamente a grupos, retendo pouca ou nenhuma relação com seus nomes ou termos  autoidentificados. Raramente o nome dos grupos era mantido, como no caso dos Haussás. Algumas autodenominações  foram englobadas a nomes mais generalistas, agrupando diversos povos sob uma mesma denominação, como Angola, Congo ou Cabinda.  As denominações aos africanos passaram a ser distribuídas a partir de critérios como a cor da pele e o local de origem, criando grupos a partir das necessidades dos brancos. Esses novos grupos, em decorrência, encontraram maneiras de se organizar social e culturalmente, até mesmo em contraponto aos demais grupos presentes na Colônia, como os brancos, os demais africanos e os mestiços.

Já no caso dos escravizados africanos no Rio de Janeiro, são encontrados registros de seus nomes ao lado de um “nome grupal”, também dado compulsoriamente a partir de critérios como o local de origem e para que função serviria na colônia. Os nomes “Antônio Mina” ou “Elório Cabinda”, carregam pressupostas características comportamentais e físicas, formas de vestir, crenças, de acordo com as suas funções no Brasil, como os que melhor servem para o trabalho doméstico, mineração, etc, cabendo possivelmente às escravizadas a designação de qual seria uma melhor parceira sexual. Alguns nomes designavam ambos os nascidos na África e os nascidos na colônia (os gentios), outros como Guiné, designavam exclusivamente os nascidos no Brasil.  Esses nomes eram mantidos como “sobrenomes” mesmo depois da Alforria. Esses sobrenomes provenientes de grupo étnico, local de origem ou função, podem ser encontrados até hoje em brasileiros e demais.

A importância do nome étnico não só é de resgatar ou manter a história de um povo, como entender através deste todas as dinâmicas de pertencimento social, classe, cultura, etc. O direito ao nome étnico é um direito de liberdade, pertencimento, expressão cultural e individual, autodeterminação e inclusão plena das diferentes composições do Brasil, sem tentar encaixá-las em uma caixa do que é brasileiro ou não. 


Referências: