O direito à adoção LGBTQ+

A adoção é um processo de constituição familiar que envolve aspectos jurídicos, afetivos e sociais, podendo ser benéfico tanto para adotantes (quem adota) quanto para adotados (quem é adotado). Durante a história, a adoção esteve presente de diferentes maneiras, já aparecendo na Babilônia, no Código de Hamurabi, primeiro código de leis escrito. 

No Brasil, assim como em outros países, a adoção teve início como uma possibilidade de obter mão de obra barata ou sucessão para fins políticos (como no caso de Napoleão, que não podia gerar filhos). Na legislação brasileira contemporânea, a adoção possui caráter fortemente afetivo, objetivando sempre os interesses do adotado, não havendo distinção legal entre filhos biológicos e adotivos. Também no Brasil, são reconhecidas as diferentes variações de família: “art. 226. §4°. Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”.

Para membros da comunidade LGBTQ+, direitos básicos, como a constituição familiar, estão assegurados por tratados internacionais, mas não necessariamente pelas legislações específicas de cada país ou região. O direito à adoção para essa população está presente em apenas 37 países, geralmente associado ao direito do casamento entre duas pessoas do mesmo sexo/gênero. Esses direitos apresentam diversas variações, a depender do contexto cultural e político de onde provém, sendo os  países cujas leis se baseiam em preceitos religiosos os menos abertos a essas configurações familiares. 

Na Ásia, por exemplo, países de maioria muçulmana que adotam a Sharia em seu código penal tendem a criminalizar a homossexualidade. Diversos países asiáticos não permitem o casamento homossexual, consequentemente também não permitindo a adoção. No Vietnã, onde o casamento homoafetivo não é permitido, uma pessoa trans casada com uma pessoa do outro gênero (se falando em binariedade) pode adotar. Já Tawain é o único país do continente a permitir a adoção por um casal do mesmo sexo.

Na Europa, 14 países permitem a adoção homoparental plena, e a Estônia permite-a apenas no caso da adoção de um enteado/a de ume parceire, mas há relatos de assistentes sociais ativamente tentando desencorajar a adoção nesses casos, como na Bélgica, França e Espanha (Messina; D’Amore 2018, citado por Souza et al, 2022). Já na África, o único país a permitir é a África do Sul. 

Voltando a América, a adoção homoparental ainda está em disputa. Nos Estados Unidos, não há nenhuma lei nacional que conceda esse direito, ficando a critério de cada estado e sua legislação específica, o que acaba impedindo a proteção dos direitos à constituição familiar em locais de maioria republicana. 

No Brasil, o direito à adoção LGBT+ não possui legislação específica, estando baseada em leis que consideram a instituição familiar em sua variedade, que protegem pessoas LGBTQ+ de discriminação, e pela decisão da Ministra Carmén Lúcia, em 2015, que negou o pedido do Ministério Público do Paraná para dissolver uma adoção feita por um casal homossexual. Para pessoas trans, a decisão favorável ao pedido de Alexya Salvador, mulher trans, para adotar, em 2015, um menino que conheceu realizando uma ação social, abriu precedente para futuros pedidos.

No entanto, pessoas LGBTQ+ ainda sofrem com empecilhos no processo de adoção no Brasil. Isso porque o preconceito ainda está presente entre assistentes sociais, psicólogos e juízes necessários ao processo, que, muitas vezes, recusam pedidos principalmente por questões morais ou preconceitos. Por exemplo, um casal lésbico é menos discriminado nesse processo do que um casal gay, por conta de estereótipos de gênero relativos à mulher como naturalmente maternal e ao homem como possível predador. Também é constatado que, a casais homoparentais, encaminham-se crianças com deficiências, doenças e históricos que as tornam “menos desejáveis” para adotantes, como forma de “compensar” o fato de serem adotantes homoparentais ou transgêneres. Para casais multiparentais, como no caso de relacionamentos poli, os precedentes são ainda mais escassos. 

O debate sobre a adoção no Brasil e no Mundo ainda está em sua infância, sendo que os direitos nessa área, tanto para adotantes quanto para adotados, ainda carecem de mais atenção e discussão sobre preconceitos e interseccionalidades. Assim como a adoção pode se tornar mais difícil para adotantes LGBTQ+, crianças e adolescentes negros, com deficiência, com doenças crônicas, de idade superior a 7 anos e outros fatores, são preteridos por adotantes. São necessárias iniciativas como campanhas para desestigmatizar as constituições de famílias não normativas para a sociedade de maneira geral, podendo, assim, concretizar ações que estão no interesse de qualquer menor de idade, como o acesso a uma família com cuidado e afeto.


Referências


Ficha técnica

Escrita: Bibiana Christofari Hotta
Revisão: Jéssica Larissa O.S. e Déborah Ramos