Como orientações LGBTQIA+ que se tratam justamente da falta parcial, condicional ou total de atração, a assexualidade e a arromanticidade são vistas, muitas vezes, como puritanismo.
Este, talvez, seja o estereótipo mais marcante entre essas duas orientações. Como a visão de que estar em um relacionamento, seja romântico ou sexual, sempre pareceu algo extremamente necessário para a sociedade, pessoas dentro de espectros que não procuram ou não experienciam este desejo ― ora exagerado, ora não ―, acabam recebendo este título ou tendo suas identidades reduzidas apenas a isso.
Sobretudo, basta uma olhada nas definições de cada um dos termos para entender que nada neles se trata de puritanismo, ou melhor, de uma escolha ou doutrina a ser seguida. Na verdade, ser assexual ou ser arromântico ― ou ser os dois ― não é conversar sobre escolha, mas sim sobre ser.
O puritanismo, entretanto, se trata de uma doutrina cristã, adotada no séc. XVI, embora já tivesse influência sobre a sociedade inglesa desde o XIV. Ser puritano, naquele tempo, nada mais era do que seguir radicalmente tudo o que enfatizasse a pureza e a integridade de um indivíduo, da igreja e da sociedade. Foi com a reforma protestante que este movimento tomou força na Inglaterra; sua teologia tinha base no calvinismo, uma vertente cristã fundada por João Calvino em 1534, que pregava:
- A predestinação, a ideia de que Deus garantia a salvação àqueles que procuraram viver seguindo os bons costumes, aproximaram-se de Deus e buscaram os indícios de sua própria salvação;
- A valorização dos bons costumes; entre outras coisas.
O puritanismo insistia na criação de uma sociedade cristã disciplinada e que a nação inteira poderia fazer uma aliança com Deus para a realização desse ideal.
E por isso é incorreto afirmar que uma pessoa assexual, arromântica ou os dois é puritana. Isso se repete ainda mais quando uma pessoa dentro dos dois espectros ― aroace; arromântiques e assexuais ― manifesta-se sobre o porquê da obrigação de estar em um relacionamento que inclua sexo e romance ― não como todo o conjunto de ações que demonstre o quanto se gosta de alguém, mas sim como a necessidade de atrair-se romanticamente por essa ou mais pessoas ― ou apenas se menciona como parte desta comunidade.
Podemos observar um leque de outras orientações dentro delas (demi, grey, fluído, etc), que mostram demais condições para que as atrações sexual e românticas surjam entre duas ou mais pessoas. E, também, sabemos que o fato de estar entre as áreas estritas desses espectros não significa um empecilho para que uma relação surja.
Em um outro texto, também postado aqui na Spacey, Sexo Sem Amor, mencionamos como um relacionamento sexual entre uma pessoas arromântica e outras, sejam elas aro ou não, atravessam os impactos que a amatonormatividade ― isto é, a norma de que que o romance deve existir e se vivido como uma essencialidade, algo vital ― tem sobre ele.
Afinal, nada as impede de ter relações sexuais ou românticas se elas quiserem. Contudo, estas orientações libertam as pessoas da necessidade exacerbada que a sociedade às impõem. A ideia de que um relacionamento romântico e sexual é intrinsecamente necessário não passa de uma concepção reforçada e repassada por séculos, mas que finalmente tem um espaço seguro para todes aquelus que desejarem quebrá-la.