“Transconveniencia” existe?

Transconveniência é um termo que se refere a discursos transfóbicos, no qual se defende que há apropriação de identidades trans por pessoas cis para obtenção de “privilégios” da comunidade. Não deve ser confundido com Trans Fake, que se refere a casos em que, em obras audiovisuais, atores cis são escalados para representarem personagens trans ao invés de atores trans. Porém, Trans Fake tem sido usado para se referir a pessoas que, supostamente, não são “trans de verdade”, algo tão duvidoso quanto a prática midiática descrita acima.

Mesmo beirando o conservadorismo ditar normas para como se deve ou não vivenciar a transgeneridade, infelizmente é algo que pode ser visto (com frequência) dentro da própria comunidade LGBTQIA+. Esses discursos afetam, principalmente, ês não-bináries, que têm suas identidades questionadas e desrespeitadas pela maneira como são expressas, em especial aquelus que não entregam androginia. Além disso, as pessoas trans consideradas “não-passáveis”, isto é, que não se veem obrigadas a encaixar-se na caixinha do que fisicamente é visto como sendo do gênero feminino ou masculino, são extremamente prejudicadas por esse discurso.

Também se torna muito prejudicial para pessoas que estão se questionando sobre seu gênero, pois, além de não levadas a sério, serão tratadas ainda pior caso o resultado da auto-descoberta revele que se identificam como cis. Em um geral, é um discurso extremamente nocivo para qualquer pessoa trans, pois reforça ideias de que só formas binárias e cisnormativas de expressar identidade de gênero são válidas.

Além disso, não existe conveniência em ser trans ou de alguma outra identidade minoritária, em sofrer ameaças, temer pela vida em qualquer ambiente e em ter seus poucos direitos garantidos constantemente ameaçados. O privilégio de gênero é, na verdade, experienciado por pessoas cis, que estão em locais de maior reconhecimento do que pessoas trans, em especial os homens cis-hétero brancos e sem deficiência.

Logo, apontar que pessoas estão se apropriando da transgeneridade para benefício próprio é sem sentido, já que qualquer oportunidade seria facilmente alcançada com o pertencimento à norma cis-hétero. Ser transgênero não possui qualquer relação com uma tentativa de alcançar privilégios ou de chamar a atenção, e é apenas uma busca em poder existir livremente, longe das caixinhas de gênero da sociedade.


Referências


Ficha técnica

Escrita: Chenny
Revisão: Viktor Bernardo Pinheiro