“Botão Gay” em Jogos

Atualmente, podemos dizer que a representatividade em diferentes tipos de mídias tem mudado de maneira significativa. Porém, mesmo com a evolução positiva em relação a forma que determinados temas, vivências e grupos são representados em obras, ainda há obstáculos a serem enfrentados. Os desafios que o desenvolvimento de uma boa representatividade exige acabam sendo bem maiores em meios cujo o público alvo se consolidou com pessoas intolerantes e preconceituosas, o que infelizmente ilustra bem o cenário da comunidade de videogames.

A fim de gerar lucros já garantidos pela fanbase consolidada, mas querendo criar uma imagem progressista e abraçar mais públicos/expandir o público consumidor, algumas estratégias são  utilizadas por empresas para atrair e manter a atenção e o desejo de consumo de ambos os grupos.

Botão Gay (ou Gay Button, no original) é um termo cunhado pela designer de jogos Anna Antrophy, se referindo a uma estratégia que permite esconder o conteúdo LGBTQIA+ de um jogo, o tornando disponível através de uma ou mais opções dadas a quem joga. Ou seja, a obra possui representatividade, desde que você queira que tenha…

Essa prática é bastante vista em jogos de RPG, especialmente aqueles que lhe dão a oportunidade de simular um romance com um grupo aparentemente variado de personagens dentro da obra. Um exemplo famoso e bem ilustrativo é o que ocorre no jogo Stardew Valley. 

O RPG de simulação de fazenda dá ae jogadore a oportunidade de customizar seu avatar, escolher seu gênero (somente masculino ou feminino) e a possibilidade de viver um romance com um dos 12 personagens casáveis, sendo 6 homens e 6 mulheres. O fato do romance poder ser vivido independente do gênero designado ae  personagem principal sugere a ideia de que todos esses personagens são multissexuais (bi, pan ou qualquer identidade que engloba se atrair por mais de um gênero), mas a verdade é que a sexualidade dos personagens é completamente condicionada pelas suas escolhas e interações com eles.

Por exemplo, se você escolher caracterizar seu avatar como sendo do sexo feminino e sáfica, ao iniciar o romance com uma das personagens femininas chamada Leah, haverá uma cena na qual  uma ex-namorada dela irá aparecer, mas, se você escolher caracterizar ê protagonista como um homem e também iniciar um relacionamento com Leah, sua ex-namorada se torna um cara.  Ou seja, a sexualidade da personagem muda radicalmente de lésbica para hétero dependendo do que ê jogadore escolhe e, mesmo que possa haver a possibilidade de Leah ser bissexual, isso nunca é abordado, o que também ocorre com os outros personagens. Mesmo que haja a possibilidade de construir um relacionamento LGBTQIA+ dentro do jogo, se você não caracteriza seu personagem assim, o jogo não te dará esse conteúdo.

Levando em conta que na maioria desses jogos não existem quaisquer outros personagens LGBTQ+s além de protagonista e dos que estão disponíveis como parceires românticos, dependendo de como ê jogadore personaliza sua experiência de jogatina, os desenvolvedores se insentam do trabalho pesado de pensar e escrever personagens que de fato representem e abordem questões da comunidade, o passando para quem vai consumir o produto final, acarretando em uma caracterização vazia, pois é perceptível que a escrita foi realizada pensando no público padrão (homens cis héteros e alosexuais), então a inclusão precisa ser feita de uma maneira neutra e implícita, tornando a representatividade algo interpretativo, não oficial.

Representatividade na mídia é extremamente importante, não só  pela identificação do público, mas também porque ao não ver determinados grupos nos meios de entretenimento e obras que consumimos em um geral, somos condicionados a acreditar que essas comunidades não são importantes e que não merecem atenção, e incorporá-las dentro de um conteúdo de forma opcional definitivamente não é uma boa forma de mostrar que essas existências importam.

Obviamente há muitas boas representações de pessoas LGBTQ+s em jogos, mas o que as tornam boas são o fato de terem sido escritas de forma a realmente representar a comunidade, e não como uma mecânica para agradar uma minoria e seus agressores ao mesmo tempo.  Embora a possibilidade de escolher sua sexualidade e isso trazer diferenças significativas para a gameplay, deve ser feito do jeito certo, isto é, retratando a vivência daquela identidade.  Não necessariamente fazendo com que o desenvolvimento da personagem gire em torno única e exclusivamente de sua sexualidade, mas que esta seja um ponto relevante e mostrado, como é o caso da protagonista Ellie de The Last of Us ou dos personagens secundários Achilles e Patroclus de Hades.


Referências


Ficha técnica

Escrita: Chenny
Revisão: Lívia Figueiredo