Heteronormatividade em relações homoafetivas

A heteronormatividade parte do princípio da relação heterossexual como natural e inerente aos gêneros masculino e feminino, referindo-se exclusivamente a homens e mulheres cis e excluindo outras identidades de gênero. Sendo assim, as relações heterossexuais são consideradas socialmente aceitáveis, pois seguem os padrões estabelecidos por uma sociedade heteronormativa, enquanto as relações homoafetivas são tratadas como diferentes ou rejeitadas.

Ela surge a partir do conceito cristão de gênero, no qual a mulher foi criada para relacionar-se com o homem,  e da construção social de gênero, isto é, o que se entende nessa concepção como “masculino” e “feminino”, pelos quais são atribuídos significados, papéis, comportamentos e expectativas — como as ideias de que “homens não choram” ou “lugar de mulher é na cozinha”, por exemplo. Ou seja, é uma maneira de adequação e aceitação pela sociedade.

Esse conceito é sustentado principalmente pela heterossexualidade compulsória, que pressupõe que todo indivíduo é heterossexual e, com isso, marginalizando outros tipos de existência. Assim, desde o que se vê nas mídias, com o exibido pelas propagandas, até as práticas estabelecidas pelas instituições tradicionais, como o casamento, a heteronormatividade cria um sistema que favorece um determinado grupo — e uma determinada forma de relação — enquanto marginaliza os “desviantes da norma”.

A influência da heteronormatividade nas relações homoafetivas

No geral, o casamento homoafetivo é visto como uma relação mais flexível emcomparação ao heterossexual. Os comportamentos tradicionalmente atribuídos ao papel do homem e da mulher, segundo as normas sociais — seja na própria relação ou nas tarefas domésticas —, ganham uma nova dinâmica em um lar homoafetivo, pois os papéis entre casais de mesmo gênero não seguem as normas e deveres sexistas em busca de adequação social, como dita a tradição do casamento heterossexual.

No entanto, como forma de repreensão à existência de pessoas homossexuais, a sociedade passa a tentar padronizar relacionamentos aquileanos e sáficos para encaixarem-se nos padrões cishetero. Afinal, se as práticas sociais são formas de controlar a sociedade e o casamento é uma prática milenar com uma forte tradição que, como apontado, reforça concepções conservadoras de papéis de gênero, esse também funciona como um meio de controlar as relações entre pessoas do mesmo gênero, uma vez que as coloca sob uma legislação sempre pensada para casais heterossexuais.

Isso leva à divisão entre ativo — quem assume a postura dominante na relação — e passivo — quem assume a postura receptiva na relação —, sendo interpretados, respectivamente,  como o “homem” e a “mulher” da relação. Muitas pessoas da comunidade LGBTQ+ — sejam gays, lésbicas ou pessoas multis que mantêm um relacionamento monogâmico com alguém do mesmo gênero (geralmente, mas não limitado a pessoas cis) — realmente acabam acreditando na imposição de gênero atribuída. Embora esses conceitos estejam muito enraizados na comunidade, eles mostram que, apesar da flexibilidade dos papéis dentro da relação, as associações de “ativo” e “passivo” são reflexos do caráter misógino presente na heteronorma.

Portanto, é importante compreender que a heteronormatividade não prejudica apenas as relações heterossexuais, mas também as homoafetivas por carregar conceitos misóginos e homofóbicos, limitando os relacionamentos e a forma de se expressar neles. Sendo assim, o melhor caminho é pensar na sua desconstrução — algo que já tem sido trabalhado pelo ativismo feminista e LGBTQ+, mas que ainda enfrenta um longo caminho pela frente.


Referências

  • Artigo: “Padrões de comportamento heteronormativos em relações homoafetivas” (Raphael Fraga, 2019).
  • Artigo:  “Heterossexualização das relações homoafetivas: uma realidade para se alcançar a aceitação?” (Rafael Reis da Luz e Hebe Signorini Gonçalves, 2013).
  • Artigo: “Invisibilidade homoafetiva nos meios de comunicação: um olhar sobre a heteronormatividade nas propagandas de outdoor no dia dos namorados” (Erieide Carla Silva e Larissa Passos, 201-).

Ficha técnica

Escrita: Amanda Diniz
Leitura crítica: Viktor Bernardo Pinheiro
Revisão: Jéssica Larissa O.S e Mariana Correa