Muitas vezes, ocorre uma falsa crença de que um ambiente ou fala está isento de preconceitos, mas um olhar mais aprofundado pode captar várias questões que afetam grupos vulneráveis. Mesmo em um país tão diversificado como o Brasil, o racismo se apresenta de diversas formas, das mais explícitas às mais camufladas — não tão camufladas assim para quem sofre com esse tipo de preconceito.
O racismo recreativo é uma das muitas formas de diminuir e machucar pessoas racializadas, sejam elas negras, amarelas, indígenas, marrons etc. Ele é realizado através de práticas com um suposto objetivo humorístico, como piadas, brincadeiras e memes, feitos de maneira que desumanizam, ridicularizam e reforçam estereótipos contra minorias raciais.
O advogado Adilson Moreira, doutor em Direito Constitucional Comparado e autor do livro “Racismo Recreativo”, fala sobre como o racismo recreativo é uma forma de microagressão, isto é, uma série de atos ou falas que não tem uma intenção aberta de ofender e marginalizar, mas sim trazem esse objetivo nas entrelinhas. No caso do “humor” racista, é possível que ele seja feito de forma inconsciente, mas o mais comum é que a pessoa tenha noção de que aquilo ridiculariza um grupo social marginalizado, ainda que não admita ou reconheça a problemática.
Historicamente, é possível reconhecer esse tipo de preconceito em diversas mídias brasileiras. O antigo programa de televisão Zorra Total, por exemplo, tinha como hábito explorar a ridicularização do povo negro, como a personagem Adelaide, interpretada por Rodrigo Sant’anna, que se apresentava por meio de blackface — prática na qual uma pessoa branca utiliza tinta preta para pintar a pele e representar grosseiramente uma pessoa negra — e “piadas” racistas, comparando o cabelo crespo a palha de aço e estereotipando pessoas negras.
Essa prática de racismo se encontra muito enraizada na cultura não apenas do Brasil, mas do mundo todo. Para além de ser uma forma de menosprezar pessoas pertencentes a grupos racializados, é também uma tentativa de desmoralizar denúncias contra este tipo de preconceito, trazendo a ideia de que não é algo sério.
As pessoas que ativamente apresentam esse tipo de “humor” tendem a utilizar o argumento da “liberdade de expressão”, alegando que tais “piadas” são apenas uma expressão artística e não ferem ninguém. No entanto, há uma falha ao não levar em consideração como o humor reflete a sociedade e como esse tipo de “brincadeira” prossegue estigmatizando e afetando vários grupos de pessoas.
Referências:
- RIBEIRO, Djamila. Pequeno Manual Antirracista. São Paulo: 1ª Companhia das Letras, 2019
- https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2023/06/15/entenda-o-que-e-racismo-recreativo-crime-previsto-na-legislacao-desde-janeiro.ghtml
- Entenda a decisão judicial contra o humorista Léo Lins por piadas sobre escravidão – Justiça – CartaCapital
- Adilson Moreira: “O humor racista é um tipo de discurso de ódio” – Justiça – CartaCapital
- Sobre Adelaide, Zorra Total e o racismo sem graça – Por Dennis de Oliveira
Ficha Técnica:
Escrita: Viktor Bernardo Pinheiro
Revisão: Arê Camomila da Silva