Transmedicalismo

Transgênero é o termo que caracteriza a pessoa que não se identifica com o gênero que lhe foi designado ao nascer, e inclui mulheres trans, homens trans, travestis, gênero-fluídes, bigêneros e diversas outras identidades; ele trata exclusivamente de identificação, não havendo uma característica específica que decida a transgeneridade de uma pessoa.

O conceito de transmedicalismo surge do endocrinologista Harry Benjamin, conhecido pelo seu trabalho de pesquisa em relação à comunidade trans. Ses estudos, que se iniciaram ao auxiliar uma jovem a realizar procedimentos que a fizessem se sentir mais confortável com seu corpo e gênero, deram origem a livros como “O Fenômeno Transexual”, e em 1979 foi criado a Associação Internacional de Disforia de Gênero de Harry Benjamin, ou Associação Profissional Mundial para a Saúde Trans — em inglês, World Professional Association for Transgender Health (WPATH).

Apesar de as pesquisas do médico terem sido benéficas em determinados pontos — o WPATH, por exemplo, possui documentos que visam auxiliar e promover saúde à comunidade trans — e ajudado diversas pessoas, a ideia do transmedicalismo, também conhecido como transfundamentalismo, é a crença de que ser trans é uma condição médica, e se baseia na ideia de que existe uma forma correta de ser trans. 

Para os ditos “transmeds” — como são chamadas as pessoas que seguem a ideologia —, uma pessoa trans dita “de verdade” teria seu não enquadramento nas normas cis-sociais de gênero baseado em disforia de gênero, havendo a necessidade de um diagnóstico formal. 

Não há um exame próprio que diagnostique tal “sintoma”, e ele costuma ser realizado por psicólogos e psiquiatras — usualmente pessoas cisgênero, que realmente veem a transgeneridade enquanto patologia —, através de estereótipos de gênero. E, como a transgeneridade era vista como uma doença e a disforia um sintoma, o seu tratamento se dava através de modificações corporais — com cirurgias, tratamentos hormonais e outros —, visando encaixar a pessoa no gênero binário “oposto” ao que lhe foi designado.

Apesar de para algumas pessoas a problemática dos discursos ser óbvia, para muitas o erro não está tão claro, sendo o transmedicalismo muitas vezes encantador aos olhos de certas pessoas. Para entender a falha ao tratar pessoas trans enquanto doentes, é possível comparar com a patologização da homossexualidade e como as identidades heterodissidentes foram por muito tempo vistas como doença — o que hoje em dia parece irreal e absurdo.

Muitas pessoas da própria comunidade trans veem o transfundamentalismo como uma ideologia coerente e necessária, negando identidades não-binárias e utilizando até mesmo da palavra transsexualidade — que hoje em dia não é mais utilizada, visto que o sufixo “gênero” supre melhor o conceito da palavra.

Já a outra parte da comunidade trans compreende o inegável: a transgeneridade trata de identificação, não tendo qualquer relação com cirurgias, tratamentos hormonais, expressão de gênero ou quaisquer outras características superficiais impostas pela sociedade cis.

Normalmente, a rivalidade entre ambos os grupos é aparente, chegando ao ponto da criação do termo “truscum”, de significado “the transsexual scum” — sendo scum uma gíria do inglês para pessoas indesejadas, utilizada como xingamento —, para tratar aqueles que se dizem transmeds.