Existência queer na cultura cowboy 

A percepção que temos atualmente do Cowboy, através dos filmes de Clint Eastwood e John Wayne, obras modernas, propagandas como a do Marlboro Man nos anos 50, jogos como Red Dead Redemption, obras de F. Remington e literatura americana, de forma geral, pintam a imagem mitológica do cowboy como o ideal homem americano — Forte, independente, bruto, inteligente, solitário e branco. Mas na realidade, a história do cowboy era muito mais complexa e colorida.

Para começar, é preciso destacar que a identidade do cowboy não era nada branca: a cultura se forma de origens principalmente hispânica e mexicana, dos chamados vaqueros. Estes, em sua maioria homens, eram trabalhadores com tarefas diversas, geralmente focadas no cuidado e transporte de gado. A partir da retirada dos mexicanos do território texano em 1821, chegam novos habitantes falantes do inglês, que se adaptam e aprendem a cultura cowboy. É estimado que 1 de 5 cowboys não eram brancos, e em algumas áreas, sua maioria era negra. Eram eles brancos, negros, hispanicos e indigenas. Entre 1860 e 1880, 25% deles eram negros. 

Um outro mito construído é do cowboy solitário. Na realidade, estes homens andavam em grupos e suas relações tinham grande importância na garantia de sua sobrevivência. O mito é construído portanto para esconder um aspecto comum na realidade dos cowboys e de outros grupos isolados de pessoas do mesmo sexo: suas relações românticas e sexuais. Muito pela distância do território oeste da cultura heteronormativa anglo-saxa mantida no leste dos Estados Unidos, conceitos modernos de sexualidade e gênero como grupos binários e diretamente influenciados (homem/mulher, hetero/homossexual e suas relações socialmente aceitáveis) havia uma cultura mais aberta a esses fenômenos. 

Essas concepções mais amplas de gênero e sexualidade podem ser vistas em diversos documentos históricos, desde jornais e relatos policiais, com a história de Harry Allen (Nell Pickerell), que hoje poderia ser reconhecido como trans ou crossdresser, e poemas, como The Lost Partner (parceiro perdido) do cowboy Badger Clark, onde o mesmo lamenta a perda do parceiro; “amávamos um ao outro como homens o fazem (…) era mais que um beijo de qualquer mulher poderia ser”. 

Essa visão histórica do cowboy com suas questões relativas à cultura, classe social, cor, gênero e sexualidade vêm sendo explorados em westerns modernos e histórias sobre cowboys em diversos tipos de mídia, como em Red Dead Redemption 2, Brokeback Mountain, Unforgiven, Year of the Dog e outros. Mas a imagem do cowboy (ícone do ideal americano), com todas suas nuances históricas, permanece um assunto polêmico e sensível, sendo ainda refletido nas produções inspiradas por suas histórias e cultura.


Referências:


Ficha técnica:

Escrita: Bibiana Christofari Hotta
Revisão: Arê Camomila da Silva