Tratar do tema “representatividade lésbica na literatura” nem sempre é fácil, uma vez que ainda é um campo que vem ganhando visibilidade gradualmente e ampliando o seu acervo de forma exponencial somente nos últimos anos.
Ao falar de representatividade lésbica, não tem como não falar de “O Poço da Solidão” (1920), escrito por Radclyffe Hall e conhecido como o primeiro livro a possuir uma personagem abertamente lésbica como protagonista. Segundo Agnes do Amaral (2016), o livro foi censurado e foi alvo de muitas críticas, motivo pelo qual ê autore publicava assinando apenas o seu sobrenome.
Além dessa revolucionária obra, houveram referências no campo da literatura à figura de Natalie Barney, dramaturga, poetisa e romancista conhecida para além de seu trabalho por suas animadas reuniões que concentravam o mais diverso público da Paris da década de 20. Dentre os frequentadores, havia um grupo de mulheres amigas de Natalie composto por lésbicas, dentre as quais lançaram trabalhos abordando a questão da lesbianidade. A própria Natalie, conhecida como “a Sapho de Paris”, tratava dessa questão em seus próprios escritos, bem como de outros temas que eram considerados tabus, a exemplo do feminismo e da não-monogamia.
É importante mencionar que há uma certa dificuldade em encontrar materiais que façam referência à palavra lésbica de forma explicita, uma vez que era incomum o uso da expressão “lébica” para referir-se a uma pessoa, e sim utilizava-se para referir-se ao comportamento sáfico.
Até hoje, segundo Agnes do Amaral, é mais difícil encontrar livros com protagonismo lésbico quando comparado à quantidade de obras na literatura que possuem personagens abertamente gays. A invisibilidade dessas pessoas é um problema cujas consequências persistem. Mesmo em leituras em que personagens lésbicas são representades abertamente, muitas vezes autories caem no erro, fazendo personagens rasos e estereotipados.
No Brasil, foi com o naturalismo que houve uma inserção de personagens LGBTQ+ nas histórias. O escritor Graciliano Ramos faz algumas referências a tais personagens em seus livros, assim como Aluísio Azevedo apresenta esses personagens de forma explícita em seu livro O Cortiço. Contudo, foi com Cassandra Rios que o protagonismo lésbico tomou proporções nacionais: com seu romance Volúpia do Pecado, lançado em 1948, a autora debate de maneira inédita relações entre pessoas lésbicas, em um livro erótico.
Apesar de ser pouco conhecida, a obra foi um dos marcos com alcance nacional acerca da lesbianidade. Além disso, foi com esse escrito que lésbicas foram representadas de forma natural, e não como um estereótipo negativo, como era comum de acontecer na época.
Desde a publicação de Cassandra Rios, a literatura lésbica prossegue expandindo-se a passos lentos, porém significativos. Com a maior visibilidade de pessoas LGBTQ+ nos últimos anos, bem como o combate e a criminalização da homofobia, criou-se um espaço no qual questões que concernem às vivências LGBTQ+ passaram a ser debatidas em maior alcance. Consequentemente, as pessoas estão mais confortáveis de escreverem e publicarem contos, livros e qualquer tipo de literatura que possuam personagens lésbicas na história, inclusive como protagonistas.
Atualmente, o Brasil está sendo uma grande referência na literatura lésbica. Autories como Natália Borges Polesso, Ryane Leão e Vange Leonel são nomes mais famosos quando trata-se do assunto, porém existem inúmeres outres autories nacionais independentes que possuem obras publicadas nas mais diversas plataformas.
A importância de falar sobre representatividade lésbica é imensa, uma vez que ajuda no processo de autodescoberta de diversas pessoas. Ademais, dar voz e visibilidade para obras com protagonismo lésbico é a porta de entrada para uma maior discussão sobre pautas acerca da lesbianidade, as quais precisam ser discutidas de forma urgente no país. Escrever sobre lésbicas, querendo ou não, é um ato político.