Durante a época da brutal ditadura de 64, a sociedade teve posturas conservadoras em diversos aspectos da sociedade, que refletiam na forma de operar da polícia. Um dos casos que marcaram a repressão LGBT foi a chamada Operação Sapatão.
A Rua Martinho Prado era conhecida por ser o “Gueto das Lésbicas”. Nessa rua está o Ferro’s Bar, um dos lugares mais conhecidos como ponto de encontro entre mulheres desde a década de 60, frequentado inclusive por famosas, como as moças da seleção de basquete. Por volta da época do ocorrido, estavam se inaugurando outros bares próximos ao Ferro’s, com o mesmo intuito. Entre eles estão o Último Tango, o Canapé e o Cachação.
Comandada pelo delegado José Wilson Richetti (que também participou e comandou outras operações), a operação foi realizada no feriado de 15 de novembro de 1980, quando a polícia entrou em estabelecimentos comerciais da Rua Martinho Prado e deteve todas as frequentadoras desses lugares. Mesmo quando elas tinham os documentos e estavam em plena regularidade com a lei, as mulheres eram detidas sob o pretexto de “Você é Sapatão”.
Em torno de 200 mulheres, lésbicas ou não, foram levadas por um camburão para uma cela na 4ª Delegacia de Polícia, e só puderam sair sob pagamento, mesmo sem terem praticado nenhum “crime”. Uma estudante que estava na parada de ônibus da rua e, mesmo assim, foi presa relatou anonimamente como tudo aconteceu, em uma matéria assinada por Omar Cupini, em janeiro de 81 – um dos poucos registros encontrados sobre a operação.
“Parece que a gente tem uma estrela na testa. Eles me levaram pra dentro do Cachação e fui logo mostrando meus documentos. Mas o policial disse: não interessa documento, você é sapatão! (…) Primeiro me colocaram numa cela com mais 50 pessoas e mais tarde houve uma seleção. Quem tivesse boa aparência, estivesse bem vestido, era tirado pra outra cela. Junto ao policial que fazia essa escolha estava uma lésbica que conhecia a turma presa e ajudava na triagem. (..) No fim, todo mundo teve que pagar. Quanto tivesse. A moça não viu ninguém sendo fichado, mas a polícia ficou com os nomes e os números de todas. (…) Um mês depois da operação, o ambiente na Rua Martinho Prado era desalentador. Bares e boates vazias. Até na rua, pouca circulação. Sinal de que daqui pra frente as lésbicas não teriam sossego nem nos poucos bares ‘em que são confinadas’”
(Reporter, Nº 37, Janeiro de 1981 p.15)