Comunidade LGBTQIA+ em Países Eslavos

A comunidade LGBTQ+ tem suas lutas ao redor de todo o mundo, mas as histórias variam de acordo com o contexto e localidade. Nos países Eslavos, por exemplo, a influência religiosa e conservadora ainda é predominante.

Pôlonia

Por conta da censura da parte da Igreja Católica e pela falta de fontes históricas, é difícil reconstituir costumes e tradições eslavas que englobassem e aceitassem as vivências da comunidade LGBTQIA+.

Muitos, se não todos os países eslavos aceitaram o cristianismo. Entretanto, eles também adotaram o costume de fazer votos, reconhecidos pela igreja, entre duas pessoas do mesmo gênero ― normalmente homens. Chamados bratotvorenie/pobratymienie/pobratimstvo, do grego adelfopoiese, que significa “a criação de irmão”, os homens unidos nesta cerimônia tinham sua relação religiosamente reconhecida como uma analogia à fraternidade ― laço de parentesco entre irmãos; mas a natureza precisa dessa relação ainda é altamente controversa, pois alguns historiadores ainda os interpretam como essencialmente um casamento homossexual.

Essas cerimônias podem ser encontradas na história da Igreja Católica até o séc. XIV e na Igreja Ortodoxa Oriental até o início do século 20. Por exemplo, votos de bratotvorenije aparecem em livros de orações ortodoxas até o séc. XVIII, nas regiões de Chelm e Przemyśl.

Contudo, ao longo da história, a homossexualidade foi muitas vezes usada como uma arma contra inimigos ideológicos ou políticos e para difamar figuras históricas mortas: considerada um desvio sexual e um sinal de degeneração mental.

Somente em 1932, com a chegada da Segunda República, as leis polonesas descriminalizaram a homossexualidade; Porém pessoas LGBTQIA+ ainda sofriam perseguições por influência da igreja e do conservadorismo predominante na sociedade polonesa. Diversas histórias sobre pessoas da comunidade foram divulgadas pela imprensa com o objetivo de justificar assassinatos ou fazer acusações infundadas contra elas apenas por sua sexualidade.

Durante o período da Segunda Guerra Mundial, poloneses gays e bissexuais não eram uma categoria específica perseguida durante a ocupação nazista da Polônia, mas eram punidos e mortos por serem poloneses.

Um dos episódios de perseguição mais marcantes foi a Operação Hyacinth, onde uma polícia secreta prendeu homens gays ou que tivessem ligações a “grupos homossexuais”. O objetivo era criar um banco de dados nacional de todos os homens gays e pessoas que tiveram contato com eles, o que resultou em um registo de cerca de 11.000 pessoas. As razões para essas ações eram, oficialmente: o medo da propagação do vírus HIV, controle de gangues criminosas homossexuais e a luta contra a prostituição. Em 2005, foi revelado que os “arquivos rosa” das vítimas das operações ainda estão mantidos pelo Instituto da Memória Nacional (IPN). Apesar das cartas de ativistas pedindo para serem destruídos, o IPN alegou que seria ilegal para eles.

Rússia

Embora a Rússia descriminalize a homossexualidade desde 1993, sob uma idade de consentimento, ainda há leis que propaguem o preconceito generalizado às minorias de gênero e sexualidade.

Há mais de 100 anos, segundo relatos do estudioso Dan Healey juntamente aos trabalhadores reunidos para assumir o controle da economia na Revolução Russa, pessoas LGBTQIA+ e mulheres trouxeram avanços sem precedentes para sua libertação. Entretanto, todos esses progressos sofreram pelo retrocesso do período Stalinista, com a perseguição estatal e o puritanismo homofóbico e sexista.

Apesar disso, entre as conquistas da revolução estava a descriminalização da homossexualidade, ato único na Europa e surpreendentemente avançado em um país com condições semifeudais — em vastas partes — em que a hierarquia religiosa havia sido um obstáculo para o Estado.

Healey revelou, também, fatos históricos ocultos, que mostram avanços ainda mais notórios: a antiga União Soviética foi o primeiro estado industrializado a reconhecer o casamento homossexual, além de liderar o mundo em cirurgias de redesignação de gênero e começar a estudar a ideia de que gênero não se resumia ao binário homem-mulher, mas, em vez disso, a um espectro.

Entretanto, com a consolidação de Stalin no poder ao final da década de 1920, uma reação social viciosa ocorreu. Em 1933, o Estado soviético encerrou comissões médicas de estudos especializados de gênero e, em 1936, restaurou a homossexualidade para o estados de crime. O legado desta reação se mantém até hoje; enquanto essas atitudes reacionárias em relação a sexualidade é abraçada na Rússia capitalista atual, ativistas ao redor do mundo estremecem com o homicídio de homossexuais respaldado pelo estado na Chechênia e a homofobia legal e social cada vez maior na Rússia de Putin.

Mesmo que muitos dos países eslavos não criminalizem a existência de pessoas LGBTQIA+, estas mesmas nações oferecem poucas ou nenhuma lei de proteção e repúdio ao preconceito contra essas minorias. Historicamente, a importância da igreja e o crescente conservadorismo dentro dessas sociedades foram e ainda são uma barreira para que a comunidade se abra e converse sobre seus direitos.

Sobretudo, a comunidade resiste ao descaso de pouco a pouco. Um bom exemplo disso está na realização da primeira parada LGBT na história da Bósnia, em 2019, que mobilizou cerca de 1200 policiais para fins de proteção para participantes. Ou, também, no projeto de lei para a legalização do casamento entre pessoas do mesmo gênero na Sérvia, em 2021. Mas algumas conquistas ainda chegam com peças incompletas, como na Eslovênia, onde o casamento entre pessoas do mesmo gênero é legalizado, mas a adoção de crianças por estes casais é barrada pelo estado.


Referências: